Em 1877, o bispo do Rio de Janeiro,
Dom Pedro Maria de Lacerda, foi pessoalmente a Turim pedir a Dom Bosco a vinda
dos salesianos para a sua diocese. Dom Lacerda os conhecera quando, por curiosa
coincidência, 34 anos após o encontro de Dom Bosco com Bartolomeu Garelli, em 8
de dezembro de 1841 (data que marca o início da obra salesiana), a primeira
expedição missionária destinada à Argentina fizera escala no porto do Rio de
Janeiro. Dessa forma, a primeira terra americana em que os salesianos puseram
os pés foi o Brasil.
Da Argentina, os salesianos passaram,
no ano seguinte, ao Uruguai; tinham como inspetor o Pe. Luís Lasagna, a quem
Dom Bosco encarregara de atender ao pedido de Dom Lacerda.
Optou-se pela abertura de um
instituto nas colinas do bairro Santa Rosa, em Niterói, e não no Rio de
Janeiro, onde grassava a febre amarela.
No dia 14 de julho de 1883, um
sábado, o vapor Oreno que, proveniente do Uruguai, entrou na baía de Guanabara,
às 13 horas. Eram sete salesianos, mais o Pe. Lasagna, que os chefiava.
Acompanhados por amigos, um bonde especial levou-os ao bairro Santa Rosa.
Diz a tradição que, ao tomarem posse
da nova casa, que ficava na subida do morro do Atalaia, aconteceu que não se
encontrava a chave.
O encarregado não aparecia. Forçaram
janelas e portas. Finalmente uma janela cedeu e por ela entraram os primeiros
salesianos.
Outra simpática tradição: a distinta
família Morrissy - cujo chefe o Comendador Guilherme Morrissy - que muito
ajudou em tudo, especialmente nos assuntos da alfândega - mandou naquela tarde
uns ovos, pão e queijo.
Por muitos anos, enquanto moravam no
Rio de Janeiro, os Morrissy ofereciam aos salesianos um queijo no dia 14 de
julho.
Mas nem tudo era festa. Os salesianos
sofreram muitas perseguições e aborrecimentos por parte dos liberais,
anticlericais e, especialmente, por parte dos protestantes. Ali perto, num Belo
edifício, funcionava o colégio deles, intitulado Colégio de Ambos os Sexos, que
era a origem das calunias e perseguições contra os salesianos.
A imprensa, influenciada pelos
protestantes, espalhava invencionices e ataques que tiveram eco até na
Assembleia Provincial do Rio de Janeiro.
O oratório festivo não se manteve. Os
protestantes conseguiram afastar todos os meninos.
De uma feita, retiraram quase todos
os alunos internos, porque os pais, que pouco conheciam os salesianos,
impressionados por essa campanha de falsidades, acharam que era mais prudente
guardar os meninos em casa. Dos dez internos que havia no princípio de 1884,
cinco se retiraram num mesmo dia e dois no dia seguinte. Eles saiam chorando,
porque se tinham afeiçoado a seus mestres.
Uma vez, o diretor recebeu no bonde
um forte soco na cabeça. Noutra ocasião, o ecônomo da casa ouviu um grupo de
molecotes a gritar-lhe: "Mata, é jesuíta!" Nesse clima de
hostilidades, os salesianos passaram a ser considerados como jesuítas sob
disfarce.
Diante de tantas dificuldades,
parecia iminente a obstrução da obra de Dom Bosco recém-instalada no Brasil. Até
Dom Lacerda chegou a desanimar: "Vejo que não mereço ter os salesianos na
minha diocese. Não tenho animo de os ver sofrer assim. Podem
retirar-se..."
Mas o diretor, Pe. Miguel Borghino, o
tranquilizou: "Foi Dom Bosco quem nos mandou. Só uma ordem dele poderia
tirar-nos daqui. E tal ordem nunca vira, estou certo. Sr. Bispo, nós
continuaremos na nossa trincheira e haveremos de vencer, com o auxílio de Deus.
Dom Lacerda, comovido abraçou o diretor".
E a obra foi vitoriosa.
De Niterói, a obra salesiana
expandiu-se pelo País.
PAULA, Antônio Pacheco de.
Salesianidade. Brasília: CISBRASIL - CIB, 2008.